Um assunto de muito interesse na prática clínica diária é o tratamento do hipotireoidismo e nódulos tireoidianos. No idoso em particular dados brasileiros estiveram presentes na última reunião da Endocrine Society-2019. O grupo da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) levou dados de mais de 10 milhões de amostras coletadas pelo Laboratório Fleury de várias regiões do Brasil para determinar os valores de referência do hormônio estimulante da tireoide (TSH) em nossa população de indivíduos maiores de 60 anos de idade.(1)
Os pesquisadores mostraram os dados baseados em valores normais de tiroxina (T4) livre, ausência de anticorpos antitireoide e medicação em uso, tendo selecionando 306.289 amostras. Apresentando os dados em sessão oral, eles mostraram que não havia diferença entre os valores obtidos de homens e mulheres, porém os valores de limites inferiores e superiores de normalidade divergiam nos indivíduos mais idosos, com marcante diferenciação dos valores superiores obtidos, que apresentavam valores de TSH mais elevados.
Esse é mais um motivo para considerar com muito cuidado o tratamento com levotiroxina no caso do hipotireoidismo do idoso.
O Dr. Erik Alexander, do Brigham and Women’s Hospital, de Boston, Estados Unidos, falou sobre o momento em que se deve passar da vigilância ativa para a cirurgia em idosos portadores de nódulos.(2)
Mostrou dados de 1.129 pacientes ≥70 anos, em um total de 2.527 nódulos ≥1 cm avaliados. A PAAF (punção por agulha fina guiada por ultrassonografia) foi segura em todos e a citologia mostrou-se benigna em 67,3% dos pacientes.(3)
A citologia levou 208 pacientes à cirurgia, mas apenas 17 (1,5%) dos que foram submetidos à PAAF tinham suspeita de carcinoma anaplásico, medular ou de metástases a distância.(2)
A histopatologia foi benigna em 44,7% dos casos operados. Todos os indivíduos de risco foram identificados na pré-cirurgia por imagem e/ou citologia. Esses indivíduos foram responsáveis por todas as mortes por câncer de tireoide (n=10; 0,9%).(2)
Entre todos os outros 1.112 pacientes, houve 160 óbitos (14,4%) durante o acompanhamento médio de quatro anos, nenhum deles relacionado ao câncer de tireoide.(2)
A análise de sobrevida desses 1.112 pacientes demonstrou que a coexistência de malignidade não tireoidiana ou de doença arterial coronariana no momento da avaliação do nódulo estava associada ao aumento da mortalidade em comparação aos idosos que não receberam tais diagnósticos (razão de risco: 2,32; intervalo de confiança: 1,66-3,26; p<0,01), o que confirma que essas são variáveis de identificação importantes antes da avaliação do nódulo tireoidiano.(2)
Assim, os idosos com comorbidades e sem fatores de risco elevado para câncer de tireoide podem beneficiar-se da vigilância ativa sem serem operados.
Os casos de baixo risco têm excelente prognóstico e apenas os microcarcinomas são considerados alvo de recomendação de vigilância ativa pelos atuais consensos. 59 pacientes (20,3% dos casos), dos 291 seguidos por Tuttle et al. durante a mediana de 25 meses, tinham nódulos de 1,1 cm a 1,5 cm. Esses nódulos se comportaram como os outros microcarcinomas, isto é, evoluíram sem metástases. Durante essa vigilância ativa, houve crescimento maior que 3 mm em apenas 3,8% dos casos (em 11 dos 291 pacientes).(3,4)
É possível, portanto, que tumores de baixo risco, mesmo que não se apresentem como microcarcinomas, também possam ser apenas observados, sem intervenção cirúrgica. O paciente deve, evidentemente, concordar com tal indicação e deve também haver um protocolo de seguimento adequado para ele.
Lizanka Marinheiro – Md, Phd.
Endocrinologista- Instituto Nacional de Saúde da Mulher Criança e Adolescente Fernandes Figueira
FIOCRUZ
Referências bibliográficas : 1. Chiamolera MI, Ramalho RF, Kanashiro I, Antonio MDS, Lima JV, Rocha LS, et al. OR19-2. Big data strategy used to draw TSH reference values for elderly population. [Apresentação no congresso da Endocrine Society − ENDO 2019; 2019 mar 23-26; New Orleans]. 2. Wang Z, Vyas CM, Van Benschoten O, Nehs MA, Moore FD Jr, Marqusee E, et al. Quantitative analysis of the bene ts and risk of thyroid nodule evaluation in patients ≥70 years old. Thyroid. 2018 Apr;28(4):465-71. 3. Wang TS, Sosa JA. Thyroid surgery for differentiated thyroid cancer − recent advances and future directions. Nat Rev Endocrinol. 2018 Nov;14(11):670-83. 4. Tuttle RM, Fagin JA, Minkowitz G, Wong RJ, Roman B, Patel S, et al. Natural history and tumor volume kinetics of papillary thyroid cancers. During active surveillance. JAMA Otolaryngol Head Neck Surg. 2017 Oct;143(10):1015-20.