Dietas sem glúten – moda ou necessidade?

Dietas sem glúten – moda ou necessidade?

Ano novo, vida nova. Depois dos naturais excessos de fim de ano, é mais que normal todos querermos” enxugar”,

“desintoxicar”, emagrecer, a partir do dia 2 de janeiro.

Costumo dizer seriamente aos meus pacientes, que agente não engorda entre o Natal   e Ano Novo… e sim, entre o Ano Novo, e o Natal…do ano seguinte.

Brincadeiras a parte, escolhi inspirada em tantas perguntas que tenho ouvido nestes últimos tempos em meu consultório, e face a imensa proliferação de vários tipos de dietas, e profissionais chamados de nutricionistas “funcionais”, em escrever sobre dietas sem glúten, embora não seja nutricionista, e sim endocrinologista.

 

Depois da grande chegada no mercado de um sem número de produtos orgânicos e naturais, nos últimos anos, os alimentos sem glúten se tornaram mais uma moda em alimentos, e em dietas. Nada mais comum que recebermos clientes com prescrições dietéticas completamente isentas de glúten!

Corredores de supermercados estão repletos de produtos orgulhosamente rotulados ” sem glúten “, e muitos restaurantes já oferecem opções  sem glúten .

 

Para as pessoas que não podem tolerar o glúten, uma proteína encontrada no trigo, centeio e cevada, essa abundância é uma bênção. Mas ultimamente, se tornou… quase que  “in”, comer sem glúten. Quase que  “ up to date “.

Com base em pouca ou nenhuma evidência científica, que não depoimentos da mídia,  ou passados de um para outro, no corriqueiro “boca a boca”, as pessoas querem de uma hora para outra na ânsia de perderem peso, mudar para  para uma dieta sem glúten, seja  para perder peso,  aumentar a energia,  tratar o autismo , ou geralmente se sentir mais saudável .

Isso não faz muito sentido para mim ou para  pesquisadores como o Dr. Daniel A. Leffler, diretor de pesquisa clínica no Centro de Doença Celíaca no Beth Israel Deaconess Medical Center, em Boston.

 

“As pessoas que são sensíveis ao glúten podem se sentir melhor, mas uma  grande parcela, não obterá nenhum benefício significativo a partir dessa prática . Elas simplesmente vão perder o seu dinheiro, porque estes produtos são caros ” , diz o Dr. Leffler, que também é professor assistente da Faculdade de Medicina de Harvard.

 

Como o glúten causa problemas?

 

Pessoas com doença celíaca não podem tolerar o glúten, nem mesmo em pequenas quantidades .

Apenas a 50 miligramas da proteína- quantidade em um pequeno crouton -, é suficiente para causar problemas. Em pessoas com doença celíaca,  o glúten na corrente sanguínea provoca uma resposta imune que danifica o revestimento do intestino delgado.  Isto pode interferir com a absorção de nutrientes dos alimentos, provocando uma série de sintomas, e levar a outros problemas tais como a osteopororose, infertilidade , lesão em alguns nervos , e  até convulsões.

 

Outras condições relacionadas chamadas de sensibilidade ao glúten, ou sensibilidade ao glúten não-celíaca, podem gerar sintomas semelhantes à doença celíaca, mas sem acarretarem o dano intestinal.

 

Há não muito tempo atrás, a doença celíaca era  diagnosticada por um processo de exclusão, muitas vezes difícil.

Hoje em dia, pode ser identificada com um teste de sangue, pesquisando-se a presença de anticorpos contra uma proteína chamada transglutaminase.

Uma biopsia intestinal confirma o diagnóstico. Ou seja, apenas esses indivíduos realmente precisam de uma dieta restrita ao glúten.

 

E o que significa comer sem glúten?

 

Evitar o glúten significa mais  que apenas  deixar de comer   pães tradicionais, cereais, massas, pizza e cerveja.

O glúten também se esconde em muitos outros produtos, incluindo vegetais congelados, em molhos tais como o molho de soja,  em alguns alimentos feitos com ” aromas naturais”, suplementos vitamínicos e minerais, alguns medicamentos , e até pastas de dente. Isso faz com que seguir uma dieta livre de glúten, seja  extremamente difícil.

 

Se você está determinado a comer  sem glúten, é importante saber que isto  pode levá-lo a algumas deficiências nutricionais. Hoje em dia a indústria de pães e cereais fortificados tornaram-se uma importante fonte de vitaminas do complexo B, por exemplo.

Apesar de pães feitos com arroz branco, tapioca, e outras farinhas sem glúten estarem se tornando cada vez mais comuns, eles geralmente não são enriquecidos com vitaminas. Isso pode ser um problema para qualquer um, mas é especialmente preocupante para as mulheres que estão grávidas ou que possam engravidar. Elas precisam de vitamina B9 , mais comumente conhecida como folato ou ácido fólico, útil e necessária para prevenir defeitos congênitos. Tomar um suplemento multivitamínico multimineral, é indicado  para quem esteja querendo evitar o glúten.

 

O trigo integral por sua vez, é também uma grande fonte de fibras dietéticas, o que é muito útil e necessário ao funcionamento intestinal assim como na absorção de gorduras.

” A dieta americana hoje é deficiente em fibras “, diz Dr. Leffler. Tirem trigo e o problema fica pior!

É possível  se obter a fibra que você precisa de outros grãos, como arroz ou quinua, ou a partir de frutas,  verduras e grãos , mas você terá que fazer um esforço, e uma alimentação extremamente bem balanceada, uma vez que outro grande problema que vemos na prática clínica diária é a cosntipação intestinal, ou prisão de ventre!

 

Se você acha que pode ter a doença celíaca ou sensibilidade ao glúten, é melhor consultar um médico antes de optar por uma dieta sem glúten. Quando uma pessoa tem evitado glúten por um tempo,  torna-se  mais difícil estabelecer se ele ou ela tem a doença celíaca, a sensibilidade ao glúten, ou nenhuma das duas.

As  dietas  sem glúten são demoradas, caras e restritivas.

Vemos corriqueiramente, vários pacientes frustrados, depois de começarem um dieta sem glúten, sem necessidade, e terem que abandonar, depois de terem ouvido verdadeiras maravilhas a respeito.

Portanto, antes de iniciar sua corrida a cara busca aos produtos isentos de glúten, e aderir totalmente a este tipo de dieta, procure saber se realmente você tem doença celíaca ou algum tipo de intolerância ao glúten, que justifique tal gasto, e tal esforço!

 

Lizanka Marinheiro

Doutora em Ciências- FIOCRUZ

Mestre em Endocrinologia-UFRJ