Depressão X tristeza

Lendo hoje uma  entrevista no Globo de Domingo, página 47 do renomado psiquiatra croata NORMAN SARTORIUS, considerado um dos maiores do mundo, mesmo sem ser especialista, resolvi comentar a matéria, e adiar meu post sobre hormônios para depois.

O mesmo, é ex-presidente da Associação Mundial de Psiquiatria e ex-diretor da Divisão de Saúde Mental da OMS, vindo recentemente ao Brasil  e reunindo 300  psiquiatras brasileiros e estrangeiros em um seminário da Liliy Neurosciences Academy, para discutirem o assunto.

A matéria tem como título Relações perigosas, e versa sobre o desconhecimento entre a depressão e outras doenças e os medos dos pacientes em encarar a mesma e entender e até diferenciar a mesma da tristeza.

O psiquiatra comenta a relação entre diabetes, câncer, doenças cardiovasculares e depressão, passando por sua relação com a maior prevalência em mulheres e a chance de 20%  dos diabéticos em geral desenvolverem sintomas depressivos.

Qual seria  a razão então?

Uma estaria na doença e outra na equipe de saúde; vejamos.

Para mim parece óbvia, o que concordo justamente com o que fala o Sartorius e inúmeros trabalhos publicados na literatura médica indexada.

O diabético, tem problemas com o peso, dificuldade em praticar exercícios físicos, o que leva a uma maior resistência insulínica, um maior aumento de peso, maior descontrole metabólico, maior baixa estima, maior tristeza, enfim: fica o ciclo vicioso!

Na volta ao clínico geral ou ao endocrinologista, esta dupla muitas vezes não consegue se entender da melhor forma possível, e o médico  não consegue ajudar o seu cliente, e fazer com que este entenda o que esta acontecendo,  e rompa esta cadeia, e ele, o doente, consiga tomar uma atitude que só ele será capaz de mudar!

Tomar seus remédios corretamente, praticar exercícios, com regularidade ( não é preciso correr uma maratona ou fazer kite surf), pode ser caminhadas, hidroginástica, dança de salão.

Nem tão pouco, retirar totalmente e de forma drástica da dieta daquela viúva de 75 anos que mora sozinha , seus biscoitinhos do chá da tarde, quando estes podem ser seu único lazer da vida…

Isso, com certeza,  a levaria no mínimo com o tempo a ficar triste.

Talvez o grande desafio da equipe de nutrição, seja adaptar a dieta de baixo índice glicêmico, de forma a que ela possa consumir sem culpa seus biscoitos, sem aumentar suas taxas de glicose , colesterol e triglicerídeos.  Na quantidade e tipo de biscoitos!!

A obesidade tem consequências na produtividade no trabalho, e isso já é um  fator predisponente para depressão.

Outra coisa que concordo em absoluto com que o Sartorius comenta, é o despreparo da equipe que atende em diagnosticar e identificar a depressão. E mostrar aos pacientes se eles estão ou não deprimidos e devem ou não usar medicamentos sem medo.

O preconceito com a doença mental, queira ou não, embora em menor escala, ainda existe por parte dos próprios médicos.

Muitas vezes os clientes vão as consultas e seus sintomas passam desapercebidos ou confundidos com outros sintomas gerais, como cansaço ou desânimo. Assim como é comum se atribuir  a causa do excesso de peso de grande parte das pessoas que nos procura por algum distúrbio da glândula tireoide, o que nem sempre é verdade, não se valoriza muitas vezes sintomas que estão bem associados à depressão.

O Psiquiatra comenta o despreparo dos especialistas em fazer o diagnóstico diferencial destes sintomas, e correlacioná-los entre si corretamente.

Isso eu pontuo e concordo inteiramente, e é um dos motivos e objetivos deste site: um atendimento integrado.

Claro que a super especialização só veio a somar na medicina atual.

Mas não podemos perder de vista o todo, sem deixar de identificar o nosso cliente como um ser único , com todas as suas queixas em conjunto, sua história sua singularidade. Existem hoje inúmeras drogas pra depressão com menos efeitos colaterais que podem e devem ser usadas para minorar uma doença que afeta milhares de pessoas no mundo. Assim como, fases e episódios de tristeza na vida devem ser percebidos e aceitos como tal, não precisando  ser medicalizados .

Cabe a nós médicos, estarmos atentos e capazes de saber fazer esta diferença.

Lizanka  Marinheiro

Chefe do Setor de Endocrinologia do Instituto Fernandes Figueira-FIOCRUZ